O prazer e a dor do silêncio

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O silêncio pode dizer muito sobre uma relação. Pode ser um silêncio feliz, de paz, como pode ser um silêncio devastador, angustiante.

Ao almoço a conversa foi sobre o silêncio da mesa ao lado. Um rapaz, que não teria mais de 25 anos, e uma rapariga, da mesma idade, namorados, passaram meia-hora sem se falarem. Ele olhava pela janela, passava os olhos pela sala, ia comendo, perdia-se no vazio, e ela também lá ia comendo, bebericando, olhando pela janela, fazendo origamis com um pedaço de papel.

Não sei se este casal é ou não feliz, se estava apenas chateado naquele dia, ou se já chegou à fase em que sentem que já nada têm para dizer ou partilhar. Este é o silêncio pesado, desconfortável, desesperante.

Ao longo dos anos tenho visto muitos destes. Gente que consegue passar toda uma refeição sem partilhar nada, sem contar nada, sem produzir um som. Eu já estive numa ou outra relação assim, e posso dizer que a coisa nunca durou mais do que uma ou duas semanas. Não ter vontade de dizer nada, de partilhar nada, de contar nada é quase sempre um sinal de desinteresse, de insatisfação. Isto pode acontecer porque não há grande química, porque estão fartos um do outro, porque estão conformados com a relação que têm e não ambicionam mais nada, porque se sentem, também, sem confiança para querer mais do que o que têm. Grave, grave é quando isto acontece em relações recentes, com semanas, meses ou até 1 ou 2 anos.

Mas o silêncio também pode ser o contrário de tudo isto. Pode ser reconfortante, tranquilizador, mas para isso é preciso saber-se estar em silêncio, saber gerir o silêncio. Eu adoro este silêncio, gosto da paz do silêncio, dos momentos em que não é preciso dizer-se nada, em que se pode estar com a pessoa que se ama, tranquilamente, a ler a uma esplanada, a apanhar sol na praia, ou até à mesa de um restaurante, mas saber quais são os momentos para o quebrar, ou apenas os gestos, um sorriso, um aperto de mão, uma graça, qualquer coisa.

Só quem vive estes momentos saberá avaliar como se sente perante os silêncios. Como disse, já vivi os dois, e nos dois acho que fui correspondido: uma sofreu e sentiu-se sufocada pela ausência de palavras, a outra sentiu-se reconfortada e confiante com o prazer do silêncio.

É muitas vezes quando não dizemos nada, quando não ouvimos nada que melhor sabemos avaliar o nosso grau de felicidade.

1 Comentário

  1. Concordo com a existência de dois tipos de silêncio, no entanto, eles também dependem do tempo de duração da relação. Não é o mesmo fazer silêncio, não ter nada para partilhar, nos primeiros meses ( em que há a verdadeira paixão)e nos anos seguintes, em que fica a amizade, companheirismo, amor. Não acho que depois de passada a fase da paixão tem que ser tudo igual aos primeiros meses e, quem achar isso, vai andar a mudar de parceiro de X em X anos em busca das emoções e vivências de uma relação de poucos meses para voltar a sentir as borboletas no estômago. Para terminar, deixem-se só contar vos que sempre que ia ao domingo almoçar a casa de uma das minhas avós, ela dizia sempre queixa " O vosso pai/avô, passa dias sem conversar comigo, sinto me sozinha, e quando vocês vêm cá já fala tanto". Eu pergunto-me … ao fim de 50 anos a dormir juntos, comer juntos, criar filhos juntos, vivendo os mesmo problemas após reforma, não se separando, que coisas haveria para contar ???? por isso realmente acho que depende de muitos fatores, cada caso é um caso, e não podemos tirar grandes ilações. É a minha opinião.

  2. O mais engraçado é que a muitos e muitos casais, que riem, saem com amigos, a jantares,discos e ferias e no entanto o relacionamento nada mais é do que uma grande comodismo( de ter alguém ao lado),de modo que todo gente os acha tão cúmplices,tão unidos e não passam de uma farsa.
    Quantos não andam assim,portanto o silencio pode ser muitas coisas.
    A dias que não nos corre bem no trabalho,ou em que quer que seja, e nem vontade de falar temos.

  3. Adorei o post, já estive em situações semelhantes, em que sabia se um de nós falasse iria despoletar uma grave discussão.
    Faz me imenso sentido o saber fazer silêncio no momento certo, tal como o saber ouvir os outros ou saber esperar pelos outros, o segredo está em saber o momento certo, gerir bem esses momentos, que no final de contas é o que nos dá a sabedoria de viver, ou seja, tal como sempre me disseram o que custa não é viver, o mais difícil é saber viver. E para isto, todos os dias e todas as cenas da nossa vida contribuem!

  4. Tinha a minha filha mais velha uma semana, quando o meu marido passou no saudoso Aya e trouxe sushi suficiente para a senhora ter colocado 4 sets de pauzinhos no saco. A primeira fase do caos pós-primeiro filho estava a passar, esperámos até ela dormir e sentámo-nos a jantar. Acho que não devemos ter trocado mais do que as palavras suficientes para pedir o molho de soja e no final, só lhe disse: acho que nunca te amei como neste momento.

  5. Quando comecei a ler ainda pensei que fosse sobre mim… Estava eu toda contente com a possibilidade de parecer ter 25 anos 🙂 Almoçamos no mesmo sitio esta semana e o tema do meu almoço foi " olha está ali o Arrumadinho" 😉

  6. Que curioso… Foi exatamente num cenário idêntico que o Villas Boas almoçou na terça feira com a esposa, no Vasco da Gama!

  7. Sabes, Arrumadinho, na minha perspectiva e experiência quando o silêncio nos preocupa ou é de alguma forma constrangedor, sem dúvida que é sintoma que algo está errado. Quando o silêncio acontece naturalmente e é só mais uma forma de nos expressarmos com o outro, então aí sim, penso que já estamos numa situação de equilíbrio.

    Quando existe muita cumplicidade e empatia, o silêncio ou a ausência dele não são realmente muito importantes… Depois há outras questões… Por ex, por norma sou alguém que não fala muito, não sou uma típica gralha, adoro estar sentada a ler o meu livrinho enquanto ele lê o jornal… e volta e meia olhamo-nos, sorrimos.. e é tão bom que seja assim, sabe tão bem! E depois há os momentos de muito riso, muita palhaçada, muita letra! Como dizia acima, é o atingir de um equilíbrio às vezes delicado =)

    Parabéns pelo teu blog! Sabe sempre bem passar aqui =)

    M.

  8. Casais que nada dizem um ao outro nas mesas de restaurante, infelizmente é do que mais se vê por aí. Chega a ser bastante deprimente. Triste mesmo, diria.
    Não consigo entender este tipo de situação, talvez porque gosto de conversar, e como diz a criaturinha do meu coração, nunca me falta tema. Das poucas vezes em que o silêncio foi rei, era quando a zanga tinha acontecido pouco tempo antes e é extremamente desconfortável. A não repetir.

  9. Há silêncios e silêncios, como tu bem disseste. Subscrevo de uma ponta à outra este post.

    Por um lado, o facto de um casal estar em silêncio pode ser, claro, um sinal de tranquilidade, de paz e cumplicidade. Isso é bom, aliás, é muito bom, porque a partir do momento em que não há silêncios desconfortáveis, significa que estamos ao lado de alguém especial e que, invariavelmente, nos é bastante cúmplice (também me lembrei daquela frase do Pulp Fiction que já li aqui na caixa de comentários).

    Por outro lado, o dito "silêncio mau" é característico de uma relação sem chama, monótona, que não acrescenta nada à realização pessoal de ninguém. A ausência de palavras, quando má, é um indicador que a relação se perdeu no tempo, e que nenhuma das pessoas envolvidas se esforçou para, enfim, tentar reatar o que outrora possivelmente foi bom. A comunicação é importante.

    Eu não tenho silêncios insatisfatórios, só quando me chateio com a minha namorada (aí claro, é mau estarmos em silêncio, mas tem de ser porque cada um tem de "estar na sua" para gerir os atritos que ocorrem). De resto, todos os silêncios são bem-vindos, já que é óptimo amar uma pessoa e, sem preciso dizer uma palavra, poder dizer tudo aquilo que se sente e se pensa no momento, com carícias, beijos, abraços… Ou simplesmente com a presença.
    Apesar de tudo, passado algum tempo de estar calado, tendo em falar (em partilhar coisas, em fazer comentários, em dizer algo). Sou uma gralha, por vezes. Tudo depende das situações, dos momentos e de saber estar.

  10. O silêncio ente um casal ,durante toda uma refeição, não me parece bom indicador ..Para mim, nessas alturas,há sempre algo a dizer, nem que seja para comentar sobre a comida ou algo que se passa em redor.Aliás a falta de diálogo entre um casal é um mau prenúncio da relação . Quanto aos outros silêncios, os cúmplices, são totalmente diferentes e necessários mas existem noutras situações e são revigorantes.

  11. Provavelmente vou repetir o que alguém já disse mas, nem tudo o que parece…é

    That’s when you know you’ve really found someone special. When you can just shut the fuck up for a minute, and comfortably share silence.”

    Às vezes o silêncio é perfeito.

  12. Tb há silêncio qd as pessoas se chateiam, depois de uma discussão onde já se disse tudo mas ainda não apetece conversar. Quando se está numa relação há algum tempo já se passou por todo o tipo de silêncio. E repetem-se…

  13. Sou a mulher dos silêncios, gosto deles, reconfortam-me, descansam-me. O silêncio a dois pode ser muito reconfortante, tal como pode ser muito desesperante. Quando comecei a namorar o meu homem, houve um dia que estava tão confusa, feliz, atordoada, que não consegui articular palavra. Ainda hoje nos rimos disso. Mas já se passou o oposto, não haver mesmo nada para dizer, tornar-se tudo constrangedor. Mas eu adoro silêncio 🙂

  14. Tenho pena que vás para o algarve, acredita que se fosses para as Areias do Seixo como eu fui ias ter um Fim-de-semana muito mais relaxante e feliz. Afinal quantas vezes não se pode ir ao algarve… Aquilo é sempre a mesma coisa, vais perder bastante

  15. eu também já passei pelos 2 tipos de silêncio… e acho que só quem está dentro consegue sentir se o tal silêncio é revigorante e nos faz bem. no fundo se é um silêncio confortável onde apenas o gesto, um olhar, um sorriso pode dizer tanto ou se, pelo contrário, é uma falta de desinteresse e empenho na relação e no outro. este último é péssimo… já o outro pode ser muito bom mesmo, sinal de plena cumplicidade entre o casal 🙂
    belo tema!

  16. "Mia: That's when you know you've found somebody special. When you can just shut the fuck up for a minute and comfortably enjoy the silence. (Pulp Fiction)"

    Este quote é bem verdadeiro, mas há um pequeno detalhe. Como o Arrumadinho disse, eles estiveram 30m sem abrir a boca e não apenas uns minutos. Há uma grande diferença. 30m é muito tempo sem dizer nada e é óbvio que há algo de errado naquela relação.

  17. É complicado, comigo não dava! Ainda mais na hora das refeições momentos de partilha e prazer:) Quem tiver comigo tem de ouvir a falar de comida o tempo todo… Agora não tem muito haver mas sabias que existe uma confraria em França de produtos do mar que fazem bombons de chocolate com recheio de ouriços do mar? Acho que vais ao céu e voltas de tão maravilhoso

  18. Também reparo nisso, mas o mais triste é ver casais que ñ dizem palavra um ao outro e ficam a ouvir as conversas das outras mesas, para passar o tempo…

  19. Eu também já passei pelos dois e posso dizer que quando existiu um silêncio, por desinteresse, desmotivação, falta de química, a coisa também não durou muito tempo.
    Ao contrário, aquele silêncio cúmplice que não é cobrado por nenhuma das partes porque ambas sentem a felicidade e o amor um do outro é das melhores coisas que há! Diria mesmo que é revigorante!

  20. É engraçado que quando estou em algum sítio também reparo se as pessoas estão ou não a conversar ou a partilhar algo. E faz-me muita confusão aquelas que se limitam a comer. Não dizem nada, não partilham nada, é quase como se estivessem sozinhas. Uma pessoa consegue perceber quando é um silêncio bom e quando é um silêncio mau e na maior parte das vezes dá para ver que é bastante mau.

  21. Eu costumo dizer, e acredito de facto nesta minha máxima, que a maior prova de intimidade e cumplicidade entre duas pessoas se atinge quando o silêncio é confortável.
    Ser íntimo é entender que até no silêncio há diálogo. Que só se tem intimidade o bastante com alguém quando se consegue estar quieta ao lado da pessoa, em silêncio, sem se incomodar com isso, sem ser um silêncio inquietante e ansioso. Esse grau só se atinge quando as mentes caminham e estão na mesma "frequência". Por isso eu sinto felicidade quando chego a este silêncio, ao silêncio cúmplice. O outro, o silêncio que perturba, esse é mau, esse é uma bomba relógio dentro das cabeças de quem o vive.

  22. Eu tenho muito desses silêncios reconfortantes. é tão bom saber que ainda há muita coisa para se falar, rir, discutir (no sentido positivo da palavra)… e que os silêncios acontecem porque há paz, porque como disses-te estamos numa esplanda a ver o mar, a ler um livro e sabemos que mesmo em silêncio aquela pessoa está ali do nosso lado, a aproveitar aquele momento de felicidade.

    Fico tão triste quando vejo casais que por vezes até estão juntos há imenso tempo, têm uma relação supostamente madura e têm desses silêncios aterradores, que não falam nada, não riem, não brincam… deve ser triste. Felizmente em 8 anos não estou nesse nível e espero nunca estar.

  23. Concordo (mai uma vez!)contigo!
    Existe, sim, esses 2 tipos de silêncio e cabe-nos a nós sabermos avaliar qual dos 2 é aquele por que estamos a passar!

    No caso do silêncio ser daquele que se quebra com um olhar, um sorriso, um toque fofinho, então é apostar nessa relação porque lá diz o ditado: "as mais belas frases de Amor são ditas pelo silêncio de um simples olhar!"

    Maura

  24. Como dizes, e bem, existem vários motivos para o silêncio apesar de eu não imaginar um almoço a dois sem uma única palavra trocada ao longo de trinta minutos. Mas isto sou eu.

    Também gosto dos meus momentos de silêncio mas esses não são vividos à mesa durante um almoço.

    Concordo que se for uma relação recente, é muito grave que não exista nada para partilhar.

    Contudo, não deixa de ser verdade que, em determinadas situações, o silêncio diz mais que mil palavras.

    homem sem blogue
    homemsemblogue.blogspot.pt

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