Miguel Pinheiro

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A SÁBADO que irá hoje para as bancas terá pela última vez o nome do director Miguel Pinheiro na ficha técnica. Após quase dez anos à frente da revista, o Miguel optou por sair, por interromper este ciclo de enorme sucesso, que começou em 2004 quando pegou numa revista recém-criada, imersa numa linha editorial confusa e disfuncional e a tornou na melhor, mais criativa e mais bem sucedida newsmagazine em Portugal.

Conheço o Miguel, precisamente, há dez anos. Trabalhei com ele em 2004 e reencontrámo-nos em 2010, quando me convidou para integrar a equipa da SÁBADO. Houve dois factores que me fizeram dizer imediatamente que sim, mal ele verbalizou a proposta: o facto de ir trabalhar para uma revista que admirava, mas, sobretudo, por poder voltar a fazer parte de uma equipa de gente de topo, dos melhores jornalistas portugueses, pessoas que só por trabalharem ao meu lado me obrigam a ser todos os dias um pouco melhor, pessoas que acreditam, como eu, na exigência máxima, na busca pelo impossível para se conseguir o melhor possível.

Nestes últimos três anos, cresci mais profissionalmente do que nos dez anteriores. E isso por culpa da cultura que o Miguel Pinheiro e o Gonçalo Bordalo Pinheiro impuseram na SÁBADO. Foi a primeira vez na vida que vi dois directores a lerem todas — mas todas mesmo — as páginas da revista, de uma ponta à outra, a questionarem cada título, entrada, início do texto, citação, frase, a obrigarem-nos a refazer textos, legendas, a escolher melhores fotos, a voltar a escrever os textos já emendados, e a escrevê-los novamente, unicamente porque achavam que teríamos de tentar fazer as coisas da melhor forma possível, já que só assim poderíamos prestar um melhor serviço ao leitores.

Quantas e quantas vezes saí daquele gabinete enraivecido por ter de refazer qualquer coisa, mas, minutos depois, e já com uma nova versão na mão, dava por mim a perceber que, afinal, eles tinham razão, e que, naquele momento, o texto estava melhor, a informação mais completa, o trabalho com mais qualidade.

Com o Miguel e o Gonçalo esta rotina era diária e aplicada a todas as secções da revista, do Desporto à Política, das Artes à Sociedade. Quantas e quantas vezes o Miguel me fez deitar trabalho para o lixo, quantas e quantas vezes o Miguel me fez mudar fotografias que já estavam em páginas prontas para irem para a gráfica, quantas e quantas vezes o Miguel me chamou e me alertou para falhas nas páginas da minha secções, desde coisas de detalhe até outras que lhe pareciam que deviam ser alteradas por uma questão de estilo. Para que isso acontecesse o menos possível só me restou uma solução: ser, todos os dias, o melhor possível, o mais atento possível, o mais rigoroso possível, o mais exigente possível para com a minha equipa. Sempre que falo do Miguel podia bem estar a falar do Gonçalo, o director-adjunto, porque os dois são um só, nas ideias, na postura, na exigência, no sentido de humor, na amizade, nas picuinhices, na retidção, na frontalidade, no profissionalismo.

A partir de amanhã, deixa de haver Miguel na SÁBADO. Mas fica, em todos nós, a cultura que eles nos passou.

O novo director, o Rui Hortelão, que entra amanhã em funções, tem a imensa sorte de herdar uma equipa de luxo, habituada ao esforço diário para tentar ser a melhor. E é esse o novo desafio de todos, directores, editores e redactores: continuar a fazer da SÁBADO uma revista que combate a preguiça editorial, que surpreende, que foge do óbvio e do cliché, que tenta sempre olhar para os mesmos assuntos de uma forma diferente.

Boa sorte ao Rui, que hoje começa.

Um imenso obrigado ao Miguel por tudo o que me deu.

5 Comentários

  1. Tenho muita pena que ele saia. É um profissional que muito admiro. Mas fico confiante de que a qualidade a que estou habituada se mantenha. Sou leitora da Sábado desde o início e uma das razões é precisamente uma das que apontou: não vejo na Sábado a preguiça editorial que vejo em muita imprensa, a “minha” Sábado “foge do óbvio”, vê-se que é feita por gente que pensa sobre os assuntos em vez de se limitar a debitar informação de agências noticiosas.

  2. Sempre gostei muito da SÁBADO desde que saiu. Gosto imenso de quase todos os temas e aprendo sempre alguma coisa de novo. Desde há uns anos que a compro sempre, aliás, é a única revista que compro e guardo todos os números.

    Adoro da organização da revista. Não é massuda, nem chata como outras do género o são. Dentro da categoria considero a melhor revista, sem dúvida alguma. Parabéns a toda a equipa.

    Que continue assim por muito tempo…

  3. Apesar de muitas vezes não concordarmos, à partida, com a opinião dos nossos responsáveis e ficarmos “amuados” com alguma decisão ou crítica, é muito bom saber que crescemos. Saber que alguém lê o nosso trabalho e acha que temos competência para sermos melhores, obriga-nos, na verdade, a dar mais. No mundo do trabalho ver o nosso trabalho reconhecido é a melhor coisa que podemos ter. O salário não é tudo na nossa profissão. Fazer o que se gosta é impagável.

  4. O Miguel Pinheiro teve muito mérito em transformar a Sábado numa revista melhor, de sucesso. Mas a linha editorial não era assim tão confusa e disfuncional nos primeiros tempos. Havia poucos meios, isso sim, e uma redacção muito pequena, que já se esforçava ao máximo por fazer um bom trabalho.
    Abraço

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