Como tento mudar (para melhor) a vida dos meus filhos

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Desde que comprei este Ecoponto caseiro que os miúdos ficam muito mais entusiasmados com essa coisa simples de deitar qualquer coisa no lixo

Há seis meses passei a adotar novas rotinas de vida mais amigas do ambiente. Lá em casa, não tem sido fácil, mas os resultados estão a aparecer.

Uma das coisas que mais me preenchem enquanto pai é a de poder passar conhecimento através da experiência e do exemplo aos meus filhos. É poder olhar para aqueles olhinhos deles completamente focados no que eu estou a fazer, prontos a absorverem tudo o que se está a passar. É muito mais fácil mostrar-lhes do que dizer-lhes, envolvê-los numa ação é mais eficaz do que limitarmo-nos a debitar informação. Nos últimos meses tenho tentado fazer isso com duas rotinas da minha vida para as quais eles não estavam particularmente atentos: o ambiente e a culinária.

Uma das mudanças mais radicais que tomei na minha vida, sobretudo nos últimos seis meses, foi a de passar a reciclar tudo. Comprei um daqueles caixotes com três divisões, e uso uma apenas para papel, outra para vidro e a terceira para plástico e latas. Tenho ainda um saco à parte para lixo orgânico/indiferenciado. E com isto, pronto, admito, sou um pouco chato. Na verdade não sou bem chato, porque os miúdos adoram todo o processo ligado à reciclagem, muito porque tentei criar entre mim e eles uma dinâmica de jogo, em que todos queremos ganhar o campeonato da reciclagem e reciclar o maior número de coisas possíveis. O Mateus, por exemplo, quer sempre ser ele a carregar com o pé no botão para o caixote se abrir, e gosta de nos informar em que caixote devemos pôr o quê. E depois adora fechar os sacos e levá-los ao Ecoponto para reciclarmos tudo.

Há dias, fiz um bolo vegan (de laranja, cenoura e banana, sem ovos e sem açúcar) e quis envolver o Mateus em todo o processo, não só na confeção do bolo como na parte de reciclar todas as embalagens e restos orgânicos que sobram sempre quando estamos a cozinhar. Costumo usar esta técnica de os envolver na execução das coisas para que eles se habituem à comida da terra e se desabituem dos pratos com excesso de sal ou de açúcar, mas também para que ganhem rotinas de reciclar tudo. Enquanto estava a cozinhar, ia pedindo ao Mateus ajuda para tudo, e fiz com que ele sentisse que também ele estava a fazer o bolo, o que fez com que, depois, o comesse com muito mais alegria. Ao mesmo tempo, ia-lhe contando histórias sobre os alimentos e sobre o processo de reciclagem, e como isso ajudava o ambiente, e a importância de termos um ambiente melhor.

Este é o meu bolo vegano de laranja, cenoura e banana (sem ovos e sem açúcar)
Este é o meu bolo vegano de laranja, cenoura e banana (sem ovos e sem açúcar)

Enquanto me ouvia, e pelo meio de mil perguntas, lá andava ele pela cozinha a colocar o frasco de geleia de arroz (é o que eu uso para substituir o açúcar) no caixote do vidro, as lascas de cenoura no saco para orgânicos ou a embalagem da bebida de aveia no caixote amarelo.

Desde que comecei com isto que os dois miúdos se tornaram numa espécie de polícias da reciclagem lá de casa. Ai de quem ouse colocar um papel no lixo dos orgânicos ou uma lata de feijão no recipiente do vidro. Sim, porque como bons fiscais do ambiente, volta e meia abrem o caixote e vão inspecionar se está tudo no lugar certo.

Os desperdícios do processo de confeção do bolo (orgânicos, plásticos e vidro) foram todos para o meu Ecoponto caseiro, bem divididos
Os desperdícios do processo de confeção do bolo (orgânicos, plásticos e vidro) foram todos para o meu Ecoponto caseiro, bem divididos

Mesmo na rua noto que a coisa está a resultar. Já lhes custa deitar uma caixa num lixo indiferenciado e perguntam sempre se não há por ali um caixote só para cartões. Outra parte que os deixa muito entusiasmados é o dia em que vamos até ao Ecoponto despejar as embalagens todas. Primeiro tenho de evitar que andem à pancada um com o outro, porque querem ambos ser eles a pôr os sacos nos recipientes, e lá tenho de os separar e de distribuir os sacos pelos dois — quem tem filhos deve saber do que estou a falar.

Tenho perfeita consciência de que a sensibilização para coisas como o ambiente, a sustentabilidade, a alimentação justa são coisas que ganham outra dimensão na nossa vida quando são ensinadas na altura em que eles são pequenos, precisamente porque têm uma pre-disposição para absorver informação totalmente diferente. Por outro lado, sei que quando crescerem, e depois de ultrapassarem a fase parva da adolescência, mesmo que não mantenham estes hábitos (porque muitos putos ali entre os 13 e os 19 querem ser “bué rebeldes” e acham que fazer o que está correto “é cena de totós”) vão seguramente lembrar-se de que o pai fazia isto e os incentivava a preservar o ambiente e a comer bem, e sei que mais dia menos dia vão valorizar estes exemplos e, acredito, fazer o mesmo que eu fiz com eles com os filhos deles. Se assim for, posso dar uma parte da minha missão cumprida.

Texto escrito em parceria com a Sociedade Ponto Verde

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